Juros no maior patamar em duas décadas são apontados por economistas como principal fator da retração, enquanto projeções para 2024 sinalizam possível alívio e estabilidade fiscal.
Uma retração de 0,2% no Índice de Atividade Econômica do país em setembro acende um alerta no cenário nacional. Economistas consultados pela Agência Brasil atribuem esse desempenho à persistente elevação da taxa Selic, atualmente fixada em 15% ao ano, o que representa o maior patamar em duas décadas. Essa política monetária restritiva, implementada pelo Banco Central do Brasil, tem impactado diretamente o consumo, adiado investimentos cruciais e exercido pressão sobre o orçamento das famílias brasileiras.
Contexto
A taxa Selic, a taxa básica de juros da economia brasileira, é uma das principais ferramentas utilizadas pelo Banco Central para controlar a inflação. Sua elevação torna o crédito mais caro, desestimulando o consumo e o investimento na tentativa de reduzir a pressão sobre os preços. Esse mecanismo é fundamental em ciclos de alta inflacionária, como o que o Brasil tem enfrentado, visando garantir o poder de compra da moeda nacional e a estabilidade econômica no longo prazo.
O Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) é um indicador crucial que funciona como uma prévia do Produto Interno Bruto (PIB), acompanhando o desempenho de setores como indústria, comércio e serviços. A queda de 0,2% registrada em setembro, portanto, é um sinal de desaceleração que reflete a resposta da economia às condições impostas pela política monetária. Esse índice é frequentemente utilizado para antecipar tendências e auxiliar na formulação de políticas.
Manter a Selic em 15% ao ano, um nível não visto em duas décadas, demonstra a firmeza do Banco Central em sua luta contra a inflação, mesmo com o custo de um crescimento econômico mais lento. Contudo, essa persistência tem um custo visível na atividade econômica. O objetivo é criar um ambiente de menor demanda para que os preços se estabilizem, mas isso implica em um arrefecimento do crescimento e de outros indicadores econômicos essenciais para o desenvolvimento do país.
Impactos da Decisão
O cenário atual de juros elevados tem múltiplos desdobramentos sobre a economia real. O professor de Economia e Direito Douglas Elmauer, do Mackenzie Alphaville, explica que ‘o cenário de juros elevados comprime a demanda, encarecendo o crédito, diminuindo o consumo e adiando investimentos’. Essa compressão da demanda se manifesta na redução das vendas no varejo, na cautela dos consumidores em assumir novas dívidas e na hesitação de empresas em expandir suas operações e inovar, impactando diretamente o dinamismo do mercado.
Os efeitos são particularmente sensíveis para o orçamento das famílias, que enfrentam um crédito mais caro para habitação, veículos e bens de consumo duráveis, tornando a aquisição de bens essenciais e a realização de projetos de vida mais desafiadora. Além disso, Douglas Elmauer aponta que a renda familiar, ainda em um processo de recuperação lento desde crises anteriores, somada à instabilidade da política monetária dos Estados Unidos – que influencia o fluxo de capitais e o câmbio –, são fatores que amplificam as restrições ao consumo e geram incertezas nas expectativas empresariais brasileiras.
A visão é corroborada por Euzébio Sousa, economista e pesquisador da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo. Ele reitera que ‘taxas de juros tão altas servem como um sinal do Banco Central para reduzir a atividade econômica’. Essa sinalização tem um efeito psicológico e prático, levando empresas e consumidores a serem mais conservadores em seus gastos e investimentos, alterando o comportamento econômico geral.
Asfixia do Crédito e Impacto no Emprego
A restrição do financiamento se traduz em uma menor disponibilidade de capital para empresas de todos os portes. Para as pequenas e médias empresas (PMEs), que frequentemente dependem de empréstimos para capital de giro, investimentos de curto prazo e expansão, o impacto pode ser ainda mais severo, limitando sua capacidade de crescimento, de inovação e, consequentemente, de geração de empregos. Muitos projetos de expansão ou modernização são adiados indefinidamente.
O impacto sistêmico na economia é notável, como enfatizado por Sousa. Ao restringir o financiamento para consumo e investimento, a cadeia produtiva é afetada em múltiplos níveis. Menos investimentos significam menos projetos, menos vagas e, em última instância, um freio no desenvolvimento econômico e social do país, com reflexos diretos na qualidade de vida da população e na sustentabilidade dos negócios.
Setores estratégicos como a indústria e o serviço são particularmente vulneráveis a esse aperto do crédito. Projetos de longo prazo que exigiriam financiamento significativo são adiados ou cancelados, impactando o crescimento futuro e a competitividade internacional. O ambiente de incerteza gerado pela alta Selic pode ainda desestimular a entrada de novos investidores no mercado brasileiro, desviando capital para países com políticas monetárias mais brandas.
Próximos Passos
Em meio a essa análise cautelosa e preocupações com a desaceleração, surge uma perspectiva diferente e mais otimista, trazida pela economista Daniela Cardoso. Ela avalia que a retração de 0,2% em setembro é um ‘evento discreto e pontual, não indicando um problema econômico estrutural’. Essa leitura sugere que a oscilação pode ser uma reação temporária do mercado a fatores conjunturais, sem comprometer a solidez das bases econômicas do Brasil a longo prazo, e que a economia tem capacidade de se recuperar rapidamente.
A visão otimista de Cardoso se estende às projeções para a Selic em 2024. Ela prevê uma queda para 12% no próximo ano, o que seria um alívio significativo para a economia e um sinal de que o ciclo de aperto monetário pode estar chegando ao fim. Uma redução gradual na taxa básica de juros é amplamente esperada por analistas de mercado, uma vez que a inflação demonstre sinais consistentes de controle e a economia precise de um novo impulso para o crescimento.
A eventual queda da Selic para 12% traria benefícios múltiplos e de grande alcance. Primeiramente, aliviaria o custo da dívida para o governo, contribuindo para a redução da dívida pública e um maior controle sobre as finanças do Estado, o que é essencial para a saúde fiscal do país. Em segundo lugar, restauraria parte da confiança de consumidores e investidores, fomentando um ambiente mais propício à estabilidade fiscal e ao crescimento econômico sustentável.
Perspectivas de Estabilidade e Recuperação para 2024
A expectativa de um ciclo de corte de juros no próximo ano é um ponto de luz para o mercado e para o cidadão comum, oferecendo esperança de um ambiente econômico mais favorável. Juros mais baixos geralmente estimulam o consumo, ao tornar o crédito mais acessível para a compra de bens e serviços, e incentivam as empresas a investir mais, com custos de financiamento reduzidos. Isso poderia gerar um novo fôlego para setores que foram mais afetados pela política de aperto monetário, como varejo e construção civil.
A estabilidade fiscal é um dos pilares para a retomada do crescimento sustentável. Com a redução da Selic, o custo de rolagem da dívida pública diminui, liberando recursos que podem ser alocados em áreas essenciais como infraestrutura, saúde e educação. Isso, por sua vez, tem o potencial de impulsionar a produtividade e a competitividade da economia brasileira no cenário global, atraindo investimentos e gerando oportunidades.
Embora as opiniões dos economistas se dividam entre a preocupação com os impactos da Selic atual e o otimismo com as projeções futuras, o consenso é que a política monetária continuará sendo um fator determinante para a trajetória econômica do Brasil. Os próximos comunicados do Banco Central e a evolução dos indicadores de inflação e atividade econômica serão cruciais para delinear o caminho da economia brasileira em 2024 e os desafios a serem superados.
Fonte:
Agência Brasil – Selic alta afetou negativamente atividade econômica, dizem economistas. Agência Brasil

